Em 26 anos, ruíram pelo menos quatro travessias em trecho de 200 quilômetros da estrada de Agudo. Fato alarmou especialistas.
A queda de uma ponte em uma rodovia é um evento raro. A queda de quatro, uma improbabilidade estatística — com a qual o Rio Grande do Sul se defronta desde a terça-feira.
O trágico desabamento da passagem sobre o Rio Jacuí, em Agudo, foi o quarto desde os anos 80 em um trecho de apenas 180 quilômetros da RSC-287 e de seu prolongamento federal, a BR-287.
A repetição do improvável espanta especialistas, sugere que alguma característica da região possa estar fragilizando as estruturas de concreto e lança um alerta sobre os riscos para as outras travessias na área.
Das quatro pontes que caíram, duas tombaram durante as enchentes de 1984, no trecho federal da rota, a oeste de Santa Maria. As outras duas foram engolidas pela água no trecho leste, estadual, em 2003 e na semana passada.
Um levantamento feito junto ao Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (Daer) e ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) revela que pelo menos cinco pontes em rodovias caíram nas últimas décadas. Isso significa que 80% dos desabamentos contabilizados ocorreram em um pequeno intervalo de uma mesma estrada. É como se vários raios caíssem no mesmo lugar.
Ao todo, há duas dezenas de pontes entre Novo Cabrais e Santiago, trecho da rodovia onde ocorreram as quatro quedas — o que significa que 20% delas tombou.
— Estatisticamente, é raro uma ponte cair. Ter acontecido várias vezes no mesmo lugar é estranho. O que temos na mão é uma improbabilidade. É urgente investigar se há uma causa comum. É preciso ter cuidado para não apavorar a população, mas essa situação merece uma investigação especial — sustenta Luiz Carlos Pinto da Silva Filho, doutor em Manutenção de Pontes, professor do Laboratório de Ensaios e Modelos Estruturais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e presidente da Associação Brasileira de Patologia das Construções.
O professor defende que se faça uma análise dos projetos das pontes da região para descobrir se eles compartilham alguma vulnerabilidade, e que se investigue se há particularidades no solo. Mas divide com outros especialistas a opinião de que a explicação mais provável está relacionada à erosão dos terrenos onde estão assentadas as fundações das estruturas da 287.
O engenheiro Eduardo Michelucci, integrante do Instituto de Perícias e Engenharia de Avaliações do Rio Grande do Sul, reforça:
— O que derruba uma ponte é solapamento das fundações. As fundações são estáveis enquanto o rio não remove o material que está lá. Se a areia e o solo são erodidos, a ponte fica instável, e uma cheia pode levá-la embora.
O que poderia estar favorecendo essa possível erosão, no entendimento dos engenheiros, é a elevação do volume e da velocidade da água nos rios da região, em um processo cumulativo. As características geográficas do entorno da rodovia dão pistas sobre por que isso pode estar acontecendo. A estrada está situada na Depressão Central do Estado, uma área baixa junto a encostas e ao início da Serra. Para lá fluem rapidamente, pela inclinação do terreno, as águas das regiões mais altas.
Nas últimas décadas, fatores extras acentuaram essa característica. A vegetação e as matas que ajudavam a reter e a atrasar a água rarearam. Ao mesmo tempo, a urbanização e a adoção de certas técnicas de plantio impermeabilizaram o solo. O resultado, segundo o engenheiro agrônomo Dalvan Reinert, vice-reitor e professor do Departamento de Solos da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), é que as águas chegam mais rápido e em maior volume aos rios.
Na véspera da queda da ponte, o Jacuí chegou a jorrar três piscinas olímpicas por segundo, conforme medição feita na Hidrelétrica de Dona Francisca. O volume de 8,2 mil metros cúbicos foi o maior já registrado no local. O recorde anterior, de 5,2 mil metros cúbicos, datava de 1997.
Nos anos 70, os Estados Unidos enfrentaram quedas de pontes provocadas pela erosão de fundações. A resposta foi a obrigatoriedade de inspeções periódicas por mergulhadores. É um procedimento caro, mas necessário, na avaliação de Silva Filho. A partir dele, seria possível saber as condições das fundações na 287 e promover eventuais reforços. Outro fator que pode estar envolvido é o assoreamento dos rios, que eleva seu nível e, por consequência, as enchentes.
— Quando se faz o projeto de uma ponte, levam-se em consideração as estatísticas sobre as maiores cheias. Se o nível de enchente na região está muito mais alto, como parece, todas as pontes podem estar em risco — avisa Geraldo Wolff, engenheiro estrutural e professor titular aposentado da UFRGS.
A queda de uma ponte em uma rodovia é um evento raro. A queda de quatro, uma improbabilidade estatística — com a qual o Rio Grande do Sul se defronta desde a terça-feira.
O trágico desabamento da passagem sobre o Rio Jacuí, em Agudo, foi o quarto desde os anos 80 em um trecho de apenas 180 quilômetros da RSC-287 e de seu prolongamento federal, a BR-287.
A repetição do improvável espanta especialistas, sugere que alguma característica da região possa estar fragilizando as estruturas de concreto e lança um alerta sobre os riscos para as outras travessias na área.
Das quatro pontes que caíram, duas tombaram durante as enchentes de 1984, no trecho federal da rota, a oeste de Santa Maria. As outras duas foram engolidas pela água no trecho leste, estadual, em 2003 e na semana passada.
Um levantamento feito junto ao Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (Daer) e ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) revela que pelo menos cinco pontes em rodovias caíram nas últimas décadas. Isso significa que 80% dos desabamentos contabilizados ocorreram em um pequeno intervalo de uma mesma estrada. É como se vários raios caíssem no mesmo lugar.
Ao todo, há duas dezenas de pontes entre Novo Cabrais e Santiago, trecho da rodovia onde ocorreram as quatro quedas — o que significa que 20% delas tombou.
— Estatisticamente, é raro uma ponte cair. Ter acontecido várias vezes no mesmo lugar é estranho. O que temos na mão é uma improbabilidade. É urgente investigar se há uma causa comum. É preciso ter cuidado para não apavorar a população, mas essa situação merece uma investigação especial — sustenta Luiz Carlos Pinto da Silva Filho, doutor em Manutenção de Pontes, professor do Laboratório de Ensaios e Modelos Estruturais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e presidente da Associação Brasileira de Patologia das Construções.
O professor defende que se faça uma análise dos projetos das pontes da região para descobrir se eles compartilham alguma vulnerabilidade, e que se investigue se há particularidades no solo. Mas divide com outros especialistas a opinião de que a explicação mais provável está relacionada à erosão dos terrenos onde estão assentadas as fundações das estruturas da 287.
O engenheiro Eduardo Michelucci, integrante do Instituto de Perícias e Engenharia de Avaliações do Rio Grande do Sul, reforça:
— O que derruba uma ponte é solapamento das fundações. As fundações são estáveis enquanto o rio não remove o material que está lá. Se a areia e o solo são erodidos, a ponte fica instável, e uma cheia pode levá-la embora.
O que poderia estar favorecendo essa possível erosão, no entendimento dos engenheiros, é a elevação do volume e da velocidade da água nos rios da região, em um processo cumulativo. As características geográficas do entorno da rodovia dão pistas sobre por que isso pode estar acontecendo. A estrada está situada na Depressão Central do Estado, uma área baixa junto a encostas e ao início da Serra. Para lá fluem rapidamente, pela inclinação do terreno, as águas das regiões mais altas.
Nas últimas décadas, fatores extras acentuaram essa característica. A vegetação e as matas que ajudavam a reter e a atrasar a água rarearam. Ao mesmo tempo, a urbanização e a adoção de certas técnicas de plantio impermeabilizaram o solo. O resultado, segundo o engenheiro agrônomo Dalvan Reinert, vice-reitor e professor do Departamento de Solos da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), é que as águas chegam mais rápido e em maior volume aos rios.
Na véspera da queda da ponte, o Jacuí chegou a jorrar três piscinas olímpicas por segundo, conforme medição feita na Hidrelétrica de Dona Francisca. O volume de 8,2 mil metros cúbicos foi o maior já registrado no local. O recorde anterior, de 5,2 mil metros cúbicos, datava de 1997.
Nos anos 70, os Estados Unidos enfrentaram quedas de pontes provocadas pela erosão de fundações. A resposta foi a obrigatoriedade de inspeções periódicas por mergulhadores. É um procedimento caro, mas necessário, na avaliação de Silva Filho. A partir dele, seria possível saber as condições das fundações na 287 e promover eventuais reforços. Outro fator que pode estar envolvido é o assoreamento dos rios, que eleva seu nível e, por consequência, as enchentes.
— Quando se faz o projeto de uma ponte, levam-se em consideração as estatísticas sobre as maiores cheias. Se o nível de enchente na região está muito mais alto, como parece, todas as pontes podem estar em risco — avisa Geraldo Wolff, engenheiro estrutural e professor titular aposentado da UFRGS.